Algumas vezes, é preciso abrir mão da visão para poder
enxergar melhor. Abrir mão no sentido de compreender, de forma consciente, que
há um mundo fantástico a espera de ser explorado. Vendas nos olhos físicos por
determinado período, forçosamente ou não, faz com que outros sentidos sejam
apurados. É um mergulho em nosso próprio abismo, em nossa escuridão interior
que tanto nos assusta. Isso é bom? Você pode estar se perguntando. Se há uma
resposta, ou melhor, se existem diversas opções de resposta eu escolho a
seguinte: “Em tudo, seja nas adversidades ou nos momentos tranquilos da vida,
há sempre um lado bom”. E que mal há mergulhar no desconhecido em nós
mesmos? Por que temos tanto medo de
explorar as brenhas das nossas florestas quase impenetráveis? A resposta óbvia
seria: porque somos receosos com aquilo que não conhecemos.
Vou lhes contar minha experiência:
Devido a uma conjuntivite viral severa, permaneci durante
cinco dias em uma escuridão total. As pálpebras inchadas não possibilitavam a
abertura dos meus olhos e, mesmo assim, com as córneas lesionadas a fotofobia
era intensa. Ali, no início de um período confuso, eu passei a não conseguir
distinguir (em alguns momentos) se estava dormindo ou acordada e percebi o
quanto sou dependente da visão. Não havia nada dentro da minha rotina que eu
pudesse fazer: ler um livro, assistir TV, usar o computador, escrever,
trabalhar, dirigir, caminhar sem a ajuda de alguém, etc. A situação me apresentou
duas opções: o desespero total ou a busca por significados para esta vivência. Escolhi
a segunda.
Nessas horas a gente aprende que não se pode controlar tudo.
Nessas horas a gente percebe que o que nos resta é simplesmente ser. Nessas
horas a gente passa a ouvir melhor, enxergar o que antes não se via... Assim
resgatei a minha “espada justiceira” guardada no meu inconsciente infantil e
pedi que me proporcionasse a tal “visão além do alcance” e, de olhos fechados,
pude ver tantas coisas que a minha retina não seria capaz de codificar. Pude
ver a mim mesma.
Não... Se pensas que estou romanceando uma doença, talvez
você esteja lendo apenas com os seus olhos que, graças a Deus, estão enxergando
o suficiente para esta conclusão (é preciso exercitar um olhar um pouco mais
apurado). Não, não estou romanceando, estou lhe contando uma história, uma
experiência que se expõe (aqui) muito aquém do que realmente é. Assim, eu
percebi o real sentido da expressão “ver com outros olhos”. E, enquanto minha
visão continua limitada, ainda sinto as marcas do que mudou em mim. Mesmo que
tenhamos a tendência a não aceitar as adversidades, ao menos, é preciso buscar
compreendê-las.
Faço sempre o melhor que posso, dou o meu melhor em cada
situação. Se isso não corresponde com as expectativas do mundo ainda procuro
superá-las, a diferença é que, com o tempo, aprendi a identificar meus limites
e aprendi que o que está próximo ao meu campo de visão é muito pouco, é apenas
um instante em relação à eternidade que habita em mim.
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